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quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Somos instantes


 
 
 
Somos instantes...
Não sei quem o disse, mas decerto muitos já o disseram.
Agora digo eu: somos instantes.
Para tudo, para todos, em tudo e em todos os lugares, situações e pessoas.
Não passamos de instantes. Momentos que passam. Mais ou menos rápido.
Instantes em que o olhar que se cruza com outro faz magia ou não. E mesmo a magia dura um instante. Mais ou menos longo.
A verdade é que na vida tudo é passageiro. Um instante. Mais ou menos demorado.
Instantes que nos ficam ou não na memória. Mais ou menos gravados.
Tudo passa, passou ou passará. As dores, os sorrisos, as lágrimas e os (des) amores.
Imaginar que somos uma câmara fotográfica em constantes disparos. São tantos os instantes que vivemos que muitos nem são notáveis de reparo.
E como esses, também nós passamos despercebidos aos olhos e vida de tanta gente.
Também nós somos instantes. Mais ou menos importantes na vida de alguém.
Somos instantes, tão pequenos, tão insignificantes no contexto do que é o Mundo.
E tão importantes no que vemos com os nossos olhos, no que é o nosso mundo. E achamos que não somos só instantes, que vamos perdurar e para sempre durar, nem que seja na memória de alguém que nos é mais do que isso, um simples instante.
Mas somos, instantes que passam num instante. Hoje somos os maiores, amanhã não passamos de um mero instante...
 
Cat.
2018.10.17

quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Domingo




É ao domingo que mais penso.

Durante a semana o correr do dia passa frenético e alucinante. Quando dou por mim já estou deitada, exausta e a adormecer no sofá, sem usufruir da vida.

É ao domingo que mais penso.

Acalmo o corpo, a mente e olho para mim. Para o que sou, o que fui e o que serei.

Olho para o que tenho, o que quero manter e o que quero largar.

Olho para as pessoas que me rodeiam e de como me sinto com elas e de como se sentirão comigo.

Olho para os que, a cada dia, se distanciam e que mantenho guardados em mim.

Sei que não sou perfeita, e estou longe de ser a amiga ideal ou a companheira ou a filha, irmã incansável e sempre presente.

Sou falha em muitas coisas, em muitos aspectos e em muitos actos. Concretizados ou por concretizar.

É ao domingo que mais penso.

Que posso sempre ser ainda melhor. Que posso julgar ainda menos.

Que posso, em cada situação, calçar os sapatos dos outros e ver com os seus olhos.

Que posso não guardar rancor ou mágoa por sair ferida de alguma situação.

Que posso sempre pedir por mais alguém que não só eu.

Eu sei que posso ser tão melhor. Mas às vezes é preciso olhar para nós e lutar por nós, pelos nossos sonhos, pelo que queremos. E isto não é egoísmo, é apenas vontade de ser feliz.

E hoje, ao contrário do dia lá fora, não choro e não me culpo por pensar em mim. Por querer mais e que melhor posso ter para mim.
 
 
Cat.
2018.09.30
 

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Negro


 
 
 
Há dias que parecem noites, apesar do brilho do sol, são negros. Negros como breu, sem ponta de luz, sem um vislumbre que permita ver um pouco que seja. E que assim nos deixam o coração, negro, pisado, magoado. E um aperto na boca do estômago, que quase nos faz deitar fora as próprias vísceras. Acredito que se o fizesse seriam negras, de tão podre, estragada me sinto.

E as lágrimas que costumam cair sem necessidade de autorização, estão presas, ali, bem por trás do negro dos olhos. Não, não saiem. Não, não caiem. Não, não me vão aliviar esta dor. Não, não vão lavar e expurgar o dia de hoje.

Há pessoas assim, que por nunca se colocarem nos pés dos outros, nos deixam assim, negras.

Há pessoas que vivem num túnel mas ao contrário: lá longe não vêem nada, só o perto do umbigo é visível e logo o que é importante,válido e real. Perfeito até.

Há pessoas que só brilham quando os outros estão na escuridão. Por elas lá colocados ou não.

E há dias em que as palavras por essas pessoas proferidas são tão negras que nos trespassam, deixam marcas e nos matam por dentro, num misto de surpresa, incredulidade e revolta.

Dias em que quase sentimos o negro, o sujo das palavras e actos na pele, como se fosse preciso lavar e esfregar até nos livrarmos de tanta escuridão...

Hoje tudo é negro como a noite que já impera lá fora.
 
 
Cat.
2018.09.29

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Consciencializar






Às vezes pergunto-me porque estou aqui, porque fico cá, porque me mantenho assim...

Não é uma resposta fácil, mas a pergunta também não.

Sinto-me, muitas e tantas vezes, presa num corpo que não se adequa ao meu sentir. Sou um tanto ou quanto imatura, fruto de ser mimada. Sim, sou uma mulher mimada e faço (uma espécie de) birra. Não lido bem com críticas, mas também não lido bem com elogios. E guardo as críticas com mais fervor que um elogio.

Acho que nunca chego. Nunca sou suficiente. E, da mesma forma com que me dou, fecho-me. Mas como gosto, como há sentires cá dentro não me contenho por muito tempo e volto a dar-me. Com tudo o que sou e que há cá dentro.

É que tenho tanto sentir dentro de mim que me ultrapassa e no entanto, muitas e tantas vezes não me apetece partilhar. Como se quisesse guardar tudo dentro de mim. E este guardar acaba por me sufocar.

Não gosto de coisas permanentes, logo não gosto de monotonia. Mas para mudar demoro demasiado tempo, penso e repenso e desespero no processo de tomar a decisão. Como se estivesse a maturar a ideia, a tomar consciência da mesma, a interiorizar as consequências.

Por isso, apesar da inconstância, não me estranhes os actos, a imprevisibilidade, a demora nas decisões.

Estou contigo por tudo o que me fazes sentir, por tudo o que sou contigo.

Estou aqui porque te amo, mesmo que por vezes não te pareça, mesmo que por vezes o meu silêncio impere.

Fico aqui porque és o meu porto de abrigo, mesmo que por vezes eu seja uma tempestade furiosa.

Mantenho-me assim porque é imenso o que contigo vivo, as recordações que juntos criámos e o quanto me fazes feliz.

Mesmo que disso duvides, não mesmo que às vezes eu pareça diferente, distante ou ausente.

Muitas e tantas vezes estou a consciencializar em mim o quanto não consigo viver sem ti...




Cat.
2018.09.23

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Tomara



Tempo de dormir, a noite já vai longa e a lua esconde-se por trás de nuvens.

Lá fora o vento canta a sua melodia por entre as folhas das árvores de forma suave e ritmada. Traz consigo o doce cheiro das belas-donas e eu fecho os olhos e consigo imaginá-las, com o seu pé longo brotando do solo, sem qualquer folha e a flor em forma de copo, com o seu cor-de-rosa forte no exterior e um risa pálido no interior.

- "São as flores do fim de Verão, significa que está quase a chegar a próxima estação" - dizia-me a minha mãe.

Sabia tudo sobre flores, desde as cores, os cheiros, o tempo de florescerem e ensinou-me isso e tantas outras coisas sobre tudo.

Tomara eu ter aprendido tudo o que me ensinou sobre a vida como aprendi sobre flores.

Tomara eu ser assim sábia.

Tomara eu ter dado mais atenção às palavras que me dirigia naquele tom condescendente que só as mães têm.

Tomara eu ser metade da mulher que ela foi pois a vida não foi meiga para com ela. Foi dura, cruel até, principalmente nos últimos anos. E não é assim que te quero recordar. Por isso, sempre que, em noites como esta, o cheiro das flores da época se fazem transportar pelo vento, eu fecho os olhos e vejo as flores em cores vibrantes e depois vejo-a, com os mais brilhantes olhos azuis, a fitarem-me e, num tom sério dizer-me: "eu amo-te minha filha, mesmo quando deres um passo em falso. E é por te amar assim tanto que vou sempre dizer-te quando errares."

Tempo de dormir e de lhe dizer que sou falha, mas que tento, todos os dias, ser mais igual a ela. Porque a nossa mãe é (quase sempre) perfeita.


Cat.
2018.09.09

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

Prometi




Prometi escrever-te todos os dias, mas os dias passaram a ter outras prioridades.

Não que sejam conscientes ou que não te escreva de forma deliberada. Não, não é isso. Ou é. Talvez seja. Talvez eu sinta que já não há mais palavras para ti. Já não há nada que já não te tenha dito anteriormente.

Talvez.

Os dias correm na sua acelerada pressa e já não há tempo para te escrever, sabes? E o que ia dizer hoje posso sempre dizer amanhã. Ou depois de amanhã. Ou depois de depois de amanhã. E depois já não tem importância e já não há o que dizer, entendes?

Porque a dado momento, dizer que te amo parece insuficiente ou banal.

Porque a dada altura as palavras soam a rotina e não é isso que se quer.

Prometi escrever-te todos os dias, mas não há vontade.

Há apenas a necessidade de, por uns raros segundos, olhar-te nos olhos e deixar o silêncio falar nessa sua imensa intensidade e que tu ouças e percebas na mesma medida, o quanto eu tenho dentro de mim para ti. Que me ouças o sentir...

E que me abraces. Me acolhas no teu peito e me deixes respirar na segurança deste meu porto de abrigo.

Prometi escrever-te todos os dias, mas hoje não há sons que saiam de mim, não há articulação de palavras ou construção de frases. Há apenas e somente o que os meus olhos dizem e o que daí quiseres sentir...



Cat.
2018.08.28

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Diário



Nunca tive um diário. Nunca guardei memórias escritas do que já fui. Acho que nunca tive muita coisa para contar. Ou só teria memórias menos boas para guardar...
Lembro-me que escrevi pela primeira vez quando me apaixonei, também, pela primeira vez. Não, quando amei pela primeira vez. Um amor proibido. Mais que proibido era quase indecente. Eu uma jovem, ele com o dobro da minha idade. Eu mais velha quatro anos que a sua filha, ele mais novo dois que o meu pai. Um amor que não se conta às amigas e muito menos à família. E tinha necessidade de colocar por escrito muito do que sentia. O amor, as dúvidas, as certezas e o medo. Escrevia sobretudo sobre o medo: de ser descoberta, de não ser compreendida, de não ser verdadeiramente, ou pelo menos, tão amada como amava.
Sinto que deveria ter escrito sobre o quanto fui amada.
Sinto que deveria ter perpetuado esses momentos de forma quase eterna.
Mas eu não sabia nada da vida e não percebia que era, não uma diversão para ele, mas mais um tormento. Hoje relembro as imensas vezes em que me convidou para viver com ele, as inúmeras vezes que, depois de me amar, me olhava de forma apaixonada e dizia baixinho "não posso fazer isto, ainda tens tanta vida à tua frente". E eu fingia que dormia para não ter que me decidir por ele. E eu jamais decidiria por ele.
Encontrei há dias as seis ou sete páginas que dediquei a esta tão importante parte da minha vida...
Não há fotografias, nem mensagens, nem emails, Facebook ou Instagram que me traga à lembrança estas memórias. Só umas míseras páginas que falam apenas dos meus receios.
O que foi bom, está guardado dentro de mim, hoje, com um olhar tão diferente do que senti. Tão mais apaziguador, tão mais adulto e crescido.
Devia ter feito um diário de todos os beijos, de todos os toques de mão por baixo da mesa, de todos os olhares que me faziam sentir uma princesa.
Apenas para olhar para o que já passou por mim e relembrar que nem tudo foram medos, receios, dúvidas, (in)certezas ou espinhos.
Há muito mais rosas que espinhos.
Há muitos mais risos que lágrimas.
Há muito mais amor que dor em mim! Muito mais!



Cat.
18/08/2018

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Silêncios XIII




Hoje preciso de silêncio...
Daquele silêncio que nos invade por completo, como se mergulhássemos no mar, num lago, numa núvem – nunca mergulhei numa núvem, mas imagino que o silêncio será idêntico.
Não quero fechar os olhos. Apenas quero silêncio.
Não quero o burburinho da cidade, com os passos das pessoas que correm ou se passeiam olhando o rio.
Não quero ouvir o passar das águas deste rio que me acompanha há anos. Quero o seu silêncio, a sua serena companhia, na revés da maré.
Não quero ouvir chamar o meu nome. Não quero o telefone a receber mensagens. Não quero o frenezim dos carros a passar.
 

Apenas preciso de silêncio. De estar comigo. De sentir que o peso da vida, das responsabilidades, dos (des)acertos, do corpo desapareçam por momentos.
 

Quero sentir-me leve. De corpo e alma.
Quero deixar-me ir, fluir sem pensar, descansar de tudo e de todos.
 

Preciso de me encontrar no meio de todo este barulho que me afasta do que sou, do que quero. Já nem consigo saber o que sou, ou sequer o que quero.
Preciso apagar este ruídos de todos os limites que me são impostos. De fechar este fluxo doentio de (parecer) fazer, (parecer) ser o que querem que sejamos. Do politicamente correcto. Do socialmente aceitável. Do que somos à frente dos outros e do que somos no nosso íntimo.
 

Fugir da hipocrisia, das falsas moralidades, dos (pre)conceitos, das mentiras, do egoísmo, mas sobretudo, dos egos de gente que não é mais gente que eu.
 

Preciso de silêncio para que no meio destes gritos consiga chegar ao meu eu. E voltar a acreditar que, em algum momento, todos temos algo de bom cá dentro...


Cat.
2018.08.13

terça-feira, 15 de maio de 2018

Réstia

Sou réstia de raios de sol,
Num crepúsculo de Inverno.

Sou brisa no turbilhão
de folhas mortas,
caídas no chão.

Sou sombra num dia carregado de chuva
Que não acaba com a sede.

Sou água salgada de um mar
Que já não se atreve a invadir o rio...

Sou amostra do que já fui.
Mas ainda respiro,
Ainda sonho,
Ainda há vida em mim.
E amor,
Ainda há amor em mim;
De mim por ti.
Imensurável,
Infinito,
Inabalável...
Até ao meu último sopro,
Até ao meu último bater do coração.


2018.03.19

(Não) Legado


Tento escrever, todos os dias tento, mas nada sai... Um rodilho de palavras que rimam de forma fraca e forçada.
Como tudo em mim: fraco e, muitas vezes, forçado.
Sim, forçado...
O levantar, o trabalhar, o comer, o sorrir e o falar: forçado.
A vontade desapareceu de mim. Como se vivesse porque apenas respiro.
Como se estivesse perdida perante a inexistência de oportunidades, de desejos ou vontades.
Como se viver fosse quase uma obrigação, um martírio.
E quando olho vejo uma vida que me deveria fazer sentir feliz: um emprego que me permite viver acima da média, com capacidade de compra, com jantares em restaurantes da moda, roupa e calçado de marca, mas acima de tudo, um companheiro que me ama. Que mais posso desejar? Que falta na minha vida que não me permite ser verdadeiramente feliz? Porquê este vazio, esta falta de ânimo, esta tristeza profunda?
Sinto, nesta fase da minha vida, que quase não construí nada: uma carreira de verdadeiro valor, uma família que seja minha...
Como se tivesse falhado em todos os passos para se dizer que se viveu: plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro.


Parece idiota, mas é um legado que não deixo.
Eu morro e tudo morre comigo.
É como se eu nunca por aqui tivesse passado.
Não deixo nada verdadeiramente meu. 


Excepto o meu amor.
 

Um amor incondicional às minhas pessoas.
Um amor maior que eu.
Um amor que não se mede e que espero preencha, pelo menos, um pouquinho do coração de quem em mim habita.
 

E é tão pouco e insuficiente e parece que não vale a pena porque quando eu me for, não há nada palpável de mim.
 

E acho que tenho que deixar algo de mim. Uma espécie de recordação perpétua do meu ser e neste momento não há nada... Só dias de vida.
Acho que é a isto que se chama "crise de meia idade", só pode!
Até agora vivi muito bem com todas as minhas escolhas e não sei porque agora as questiono...
Acho que no fundo, não passo de uma simples mulher, que afinal se deixa pressionar pelas expectativas sociais, pelos sonhos que nos incutem.
 

Talvez se tivesse casado, se tivesse um filho, um jardim e uma árvore, não me sentisse tão vazia.
Ou talvez estivesse assim, igualmente perdida e a questionar a minha vida...



2018.02.13

Quando sentes que morres


Quando sentes que morres...

A noite mostra-se igual ao dia: fria, chuvosa e escura, negra como a minha alma.
Hoje não há nada mais que o silêncio.
O silêncio do vazio em que vivo.
O silêncio do nada que domina a minha vida.
É como se nada existisse, nada tivesse vivido, sentido, dito ou feito.

Nada.

Um vazio espelho da minha vida. Não há legado que deixe. Não há feitos de que alguém, algum dia, no meu leito de morte, referencie, recorde ou enalteça.

Não, nada.

Só esta vívida sensação de ver os dias passar. Um seguido do outro, sempre iguais.
Até o cansaço desistiu de se fazer sentir. Não há revolta em mim.
Não há vontade ou sonhos.
Somente esta sensação de total fracasso.
Não é vazio, é fracasso.
Para com os que amo, os que me amam e para comigo.
Nunca fui de criticar, sempre fui de compreender e aceitar, às vezes até de perdoar.
Hoje, sou tudo o que abomino nos outros: fraca quando coloco o amor à frente do orgulho; fraca quando acredito que as pessoas podem mudar.
 

Mimada,tenho ouvido com frequência. E que amuo quando não tenho o que quero ou como quero; infantil portanto.
A verdade é que é verdade.
Sou o invólucro de uma mulher que não existe. Como se tudo o que fiz e o que sou está errado ou não é verdadeiro, sentido. A ideia que criei de mim, de mulher independente, adulta, madura, nada egoísta, compreensiva e até inteligente e sensual, desmoronou.

Perdi-me. Não está aqui, não é esta que vejo quando olho ao espelho.

Perdi-me. Não me reconheço. Não sei quem sou hoje ou quem serei amanhã.

O que fui ontem morreu e o fracasso, o vazio, o silêncio e o nada é o que impera em mim.



2018.01.05

Medo

É noite e não se vêem as estrelas brilhantes no céu.
Chove. Chove num qualquer típico mês de Dezembro. Cai, há horas, uma chuva constante e fria, como uma canção de embalar que nos entorpece os sentidos.
Chove e não há pessoas na rua. Não há sinal de vida activa. Não há sons que me digam que o dia está prestes a chegar.
 
Tudo está adormecido.
 
Não há cheiro a flores no ar e há muito que o cheiro a terra quente e molhada se foi. Não há jasmim no jardim, as folhas já não balançam ao sabor do vento nas árvores pois jazem no chão, esquecidas, sem cor e sem vida.
 
Tudo está adormecido.
 
Até aqui, dentro do meu quarto, dentro de mim.
Apesar dos olhos abertos, apesar de acordada, estou adormecida.
Adormecida, na esperança que o tempo que teima em passar, de repente, parasse e se suspendesse. E eu, dormente no sentir e no pensar, apenas aguardasse que o tempo voltasse a ter vontade de passar e de correr no seu normal passo e aí, só nesse momento, eu acordasse e regressasse ao que é o meu viver.
 
Mas o tempo não se compadece comigo. Não me obedece e passa sem complacência alguma e, sendo quase dia, prova que eu não há forma de suspender o seu passar.
E o tempo passa, depressa e indiferente ao meu querer. E eu queria que ele parasse, que não me trouxesse as mudanças que se avizinham.
Que me permitisse vivê-lo sempre da mesma maneira: tranquila e rotineira.
Mas não, o tempo não pára e a cada dia que passa o tempo para a mudança é mais escasso.
 
E a mudança assusta-me.
 
O inesperado, o incerto, a perda da aparente segurança assusta-me.
Eu não quero que o tempo pare, eu quero não ter medo do que me espera.
Eu quero ter força para acreditar e esperança para enfrentar o que o futuro me reserva.
 
Mas a mudança assusta-me.
 
E é este medo que me impede de ver o meu valor, de ver que, até hoje, nunca falhei a mim própria, nunca me corrompi e sempre me superei.
É o medo que me comanda hoje...
Amanhã tudo será diferente e o que será apenas com o tempo poderei saber. E cá dentro, bem no fundo de mim, bem no âmago do meu ser, sei que será melhor.
Eu sei sempre quando tenho de mudar, quando já não tenho nada a aprender ou a ensinar naquele lugar, com aquelas pessoas...
E há muito que o sei.
E há muito que devia ter impulsionado a minha mudança. E quando não o fazemos por iniciativa própria, é-nos imposta.
Há que Crescer, Evoluir, tornar-me melhor para e com os outros.
 
Mas isso assusta.
 
Saber que o que temos não nos chega, não nos preenche, não nos deixa Viver de forma plena e que temos que avançar, mudar e não se sabe bem como, assusta.
Principalmente quando há quem dependa de nós. Apesar de nos incentivarem, de nos acompanharem, de, acima de tudo e todos, em nós acreditarem e confiarem.
Decisões que nos viram a vida ao contrário, assustam.
E é o medo que me comanda hoje.
E eu queria que o tempo apenas parasse até que o medo me soltasse e abandonasse...


2017.12.15

Páginas


O dia já se deu por vencido e cedeu o seu lugar ao negro da noite.
Há vento a acompanhar a sua partida.
Um vento demasiadamente ameno para um qualquer dia de finais de Novembro.
Não há vontade de ceder às vitrines das lojas enfeitadas com as cores e adereços típicos de Natal. Não há espírito para nos perdermos no descontrolo das compras, das prendas e das lembranças (a)típicas habituais.
Nas ruas os passos não se apressam para regressar a casa, tudo é compassado e tudo acontece como todos os dias, num ritmo que nos entorpece os sentidos e em que hoje é igual ao ontem e será igual ao amanhã. Uma cadência que não se sente, que passa por nós sem fazer mossa, sem se fazer ver, ouvir ou sentir.
 
Um dia após o outro. Iguais, em nada divergentes, em tudo indiferentes.
 
Um virar de páginas vazias. Não aproveitadas. Perdidas. De nada escritas. De nada preenchidas, senão de fúteis banalidades.
 
E eu, aqui dentro de mim, sou tão mais que este vulgar passar de tempo. Carregada de sentimento. Imersa em vontades. Cheia de um milhão de pensamentos.
 
Plenamente confiante de que as minhas páginas não se perdem no branco do tempo corrido.
 
Aqui, dentro de mim, faço, a cada dia, o exercício de preencher o meu livro, a minha vida.
2017.11.22

Apenas livre






A noite ainda reina, se bem que apenas por mais uns minutos. As estrelas já não se mostram no céu, envergonhadas pela luz de um sol que começa, por detrás da colina, a brilhar.
Na roseira, as pétalas já gastas ganham um novo tom, mais vivo, mais forte, à custa das gotas do orvalho.
Os pássaros ainda não cantam, mantêm-se resguardado, suspensos nos ramos das árvores, à espera que a vida (re)comece.

Assim como eu.

Aqui, dentro destas quatro paredes; dentro desta carne, confinada.

Presa. Ao ritmo das horas e do correr dos dias, das obrigações e compromissos que me dominam a vida.
Presa. Ao respirar e ao correr do sangue, cadenciados, quase imperceptíveis, quase incontroláveis.
Presa, em ambos os sentidos, metafórica e literalmente.

Apenas livre por poder vaguear até onde o corpo puder.
Apenas livre nos momentos em que a mente, se ainda tiver força, se ainda tiver esperança, ainda quiser acreditar...

Aqui dentro a noite ainda se faz sentir, mesmo sem o habitual sonhar, mesmo sem o necessário dormir.
 
 
2017.08.16

Se os meus olhos falassem

Se os meus olhos falassem o que diriam?

Que as salgadas lágrimas que deles brotam são de dores ou alegrias?

De todos os momentos em que o sol, apesar de brilhar, não me aquecia o coração, não me chegava à alma.

De cada vez em que recordo a minha mãe e sei que o seu abraço era único e que sou privilegiada por ainda não ter esquecido o seu cheiro, o calor do seu corpo.

Naquele instante em que te olho, meu amor, e não resisto à felicidade que é tu me amares e como perfeita me veres e sentires.

Se os meus olhos falassem diriam que a cada dia há um sentir diverso, um ver diferente.

Há um sonho que morre e uma esperança que nasce.

Há lágrimas que quase me matam e outras que me renovam.

Se os meus olhos falassem diriam que eu simplesmente vivo!


2017.08.07

Tão simplesmente

 
Há dias em que me sinto pequena.
Uma mulher pequena, com uma alma pequena, a viver uma vida pequena.
 
Pequena na verdadeira essência da palavra.
Pequena de sentimentos, de vontades, de acções.
 
Em que sinto que não passo de alguém que sabe apenas sobreviver. Um dia de cada vez.
Em que a felicidade é efectivamente efémera e o dia a dia é cheio de pequenas e vazias situações que acabam por encher(me) de penas e dores.
Em que tudo me esgota.
Em que as forças de olhar o dia como algo novo não passa de uma mera ilusão.
 
E eu canso-me. Demasiadamente depressa.
E deixo de sonhar, de querer alcançar e invade-me esta sensação de (quase) desistir.
 
Não há sol que brilhe o suficiente.
Não há flor em que o perfume me inebrie o suficiente.
Nada é suficiente. Nada chega para inundar o vazio que se apodera do corpo, da alma e da mente.
 
Um passar de horas igual ao de ontem.
 
Isto tão somente.
 
Um mundo pequeno, de dias imensamente longos.
Uma vida pequena, sem grandes feitos, com a sensação de não deixar, legar, ensinar nada.
 
Isto tão simplesmente.
 
 
2017.08.06

Mundo

A noite já domina há muito as cores do céu e o sol já se perdeu, faz horas, por trás da linha do horizonte.

O silêncio domina a rua, agora vazia de gente, sem o cantar dos pássaros e o riso das crianças.

Aqui dentro não há silêncio que resista.

Aqui dentro do meu peito há um ardor que me queima.

Um aperto que me esmaga. A Alma.

Nos dias que correm, onde a informação voa de forma inimaginável penso: como é possível?

Como é possível que em pleno século XXI ainda há tanta fome, tanta xenofobia, tanto desprezo para com o Ser Humano, para com os animais?

É desolador ver as notícias.

É desolador saber o que se passa pelo Mundo.

É desolador de uma forma que me sufoca o respirar. De uma forma que não contenho as lágrimas. De uma forma que me sinto de tal forma impotente que me dói cá dentro, que me dilacera como uma faca.

E depois, olho para o "meu mundo" e vejo como sou uma mulher de sorte. Como as pessoas que me rodeiam são boas, simples e com um coração enorme.

Vejo que tenho tudo, que ainda posso olhar o Mundo e, no meio de tanta feiura, sentir que ainda há esperança. Que o céu azul ainda me faz sonhar, que o mar será eternamente salgado e igual às nossas lágrimas. Que ainda podemos mudar algo e que a maldade, o egoísmo e a falsidade serão, um dia, apenas uma lembrança de um sonho menos bom.



2017.07.25

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Desistir



Às vezes apetece desistir.
Baixar os braços, deixar de lutar, resignar-me às evidências e ficar.
Apenas ficar.
Parada. Imóvel. Inactiva. Desligada.
Não fazer parte da acção, só reagir. Automaticamente.
O essencial para não morrer. E assim, não me desiludir, não me entristecer, não me aborrecer, não me nada.
Não pensar, não desejar, não sonhar, não almejar, não nada.
Não pedir, não suplicar, não falar, não gritar, nada.
E eu grito sem que me ouças a voz.
Um grito surdo que me sai da garganta potente e forte e se esvai, propagando-se no espaço como nada. Como o silêncio. E a vida, apesar do grito, segue, impávida e serena.
E o que cá ficou dentro por gritar, é um nó impossível de desembaraçar, um emaranhado de pensares que nunca de
viam ter existido, nunca deviam ter tentado sair, nunca deviam ter-se permitido tentar fazer ouvir...


10.Fev.2016

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

(In)Felicidade



Vazia. Oca. Uma casca de noz sem miolo. Não, uma casca com miolo, podre, intragável.
Agora transporta essa imagem para um humano. Uma humana, eu.
Um corpo que definha a cada ano. Um corpo que denuncia as variações do passar dos dias.
Um rosto marcado por rugas de quem riu e também chorou.
Um rosto endurecido pelas vivência de quem foi... (In)Feliz.
E um recheio pior ainda. Cravado do cheiro putrefacto de quem tem nada. Nada de bom por dentro.
Recheio crivado de espinhos feitos por mágoas, dores, despeito, amargura.
Um ser que se fechou e em si guardou e alimentou com o próprio ser, com a própria alma sentimentos de nada mais do que dor.
A impossibilidade de se libertar de tudo o que construiu à sua volta.
A impossibilidade de algum dia acordar deste tormento que é viver e descobrir que deixou de respirar.
Uma queda vertiginosa num abismo sem retorno mas que nos tenta.
Ser infeliz é uma escolha... Muito mais fácil do que a de perseguir a felicidade.


28.Jan.2016

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Pequenez


Dou por mim a pensar no que sou. No que me move. No que me alimenta os dias. No que me acalma o corpo e, sobretudo, a alma.
A verdade é que sou nada.
Olho e ao meu redor há tantas pessoas de valor. Há tanto quem lute e consiga levar os sonhos a bom porto.
A verdade é que sou pequena. Muito pequena, como a minha vida. Como os meus dias.
Sou feliz? Tem dias que não. Mas na verdade, sou. Quase plenamente feliz. Tenho mais do que a maioria das pessoas.
Se poderia ter mais? Não.
O que tenho é-me para lá de suficiente. Não, não falo de bens materiais. Do ter, possuir e acumular em expositores ou de chegar a parecer uma montra ou uma página de catálogo.
Falo de tudo que não é palpável. De tudo que é conceito abstrato.
Falo de amor: incondicional aos que me são próximos. Aos que de mim dependem.
Falo de amizade: em que o dar é sem esperar algo de volta, sem expectativas. É sempre gratificante.
Falo de beleza: da possibilidade de ver, de sentir, de apreciar, de poder cheirar paisagens, flores, cores. De poder calcorrear locais longínquos e eternizados há séculos. Das pessoas na transparência da sua alma e da inocência que ainda se encontra.
Falo de liberdade: de escolha. De pensar. De expressão. Pessoal.
Falo de respeito e falo de viver. Sim, eu vivo feliz.
E na pequenez do que me traz felicidade há uma gigante imensidão de pequenas mas valiosíssimas coisas.


27.Jan.2016