sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Silêncio IX



Há silêncios que imperam de forma abstrata, que chegam devagar, com passos que não se sentem mas que se vão impondo por períodos de tempo cada vez mais longos e que se nos vão apoderando da companhia que acabamos por perder.
Há silêncios que nos são impostos. Que não advêm do passar dos dias, que não surgem som o tempo, que são apenas uma negação ao que dizemos. Como se não existíssemos. Como se não falássemos, como se as palavras que de nós saiem ficassem presas numa espiral de tempo amorfo, parado, que nunca se concretizassem, nunca pudessem de facto ser ouvidas. Perdidas para sempre no espaço, no vento que não corre e não as leva ao destino.
E aqui surge a pior das solidões: quando há tanto a dizer e não há quem queira ouvir, quem as queira sentir connosco, quem as queira perceber e devolver-nos o pensamento sob a forma de outros sentimentos ou lógicas ou vivências.
Há silêncios que doiem mais que a ausência de sons...

16/12/2012

Imperfeitamente perfeita



Não há vento, nem chuva, nem frio e nem sol apenas essa inexistência da luz que nos faz viver e aqui dentro, destas paredes que não vejo mas sinto a presença, há vida.
Existo eu.
Existe o meu corpo e o que sinto, o que desejo e o que penso, o que não tenho e o que nego e rejeito.
Há um corpo que desperta suavemente em movimentos que sentem a tua ausência no leito feito frio nessa dolorosa percepção e logo uma recordação ultrapassa o vazio e me enche de emoção.
E é tudo o que quero.
Viver numa constante emoção que me complete e faça inteira e me preencha e faça sorrir a toda a hora e que me faça chorar e crescer e aprender a lidar com tudo do que nos apetece fugir.
Não quero que o nascer do dia me traga um conto de fadas mas quero mais, muito mais que esta vida aparentemente perfeita e vazia de partilhas.
E eu quero partilhar-me, dar-te e receber-te, aprender-te e crescer-me, ensinar e apoiarmo-nos, que me aceites as qualidades e me ames pelos defeitos.
Não quero um conto de fadas, quero uma vida real construída e tornada, a cada dia, na nossa imperfeitamente perfeita vida.

15/12/2012

A noite



A noite é senhora do momento, impera negra e sombria, apenas abraçada por fugazes luzes de carros que passam num quase voar onde a chuva antecipa o seu chegar num ruído ritmico e sem compasso.
Cruzo-me por transeuntes que não têm rosto ou forma tão escondidos que estão nas suas vestes pesadas e quentes de Inverno.
E sinto.
E tudo parece parar em meu redor.
E inspiro. E sinto de novo.
A tentação de rodar o olhar é mais forte e caio num pecado que nada tem de culpado.
O corpo estremece de um lado ao outro, dos tornozelos ao pescoço e a pele, a pele arrepia-se como se fosse tocada daquela forma que poucos, que apenas tu sabes.
Os lábios entreabrem-se e o vapor quente do meu corpo faz sinais de fumos ao ritmo da língua como se te provasse na minha boca.
E sinto.
O cheiro que sendo teu não é o teu odor e que me recorda desta forma intensa e imensa, em apenas breves segundos, como é te amar, te sentir e te desejar.

14/12/2012

Alturas do dia



Há na rua os sons do largar dos empregos misturados com os sons do regresso a casa num compasso de ritmos aleatórios de passos largos e pesados e de outros leves e quase parados em que a chuva apenas se sente junto com o vento frio que nos faz olhar apenas o chão.
Se há altura do dia em que a tua presença mais me invade o pensamento, é sem dúvida, neste exacto momento feito de minutos em que a minha mente se solta do corpo que exausto largo sob um canto acolhedor deste local a que habitualmente damos o nome de lar e viaja até às recordações de ti.
Este momento em que o sorriso nos teus lábios me receberia ao abrir da porta. Em que o meu corpo no teu peito se aconchegaria. Em que a tua voz chamando-me de "meu amor" seria a melhor das melodias. Em que o sabor da tua boca deveria invadir a minha. Em que o cheiro do teu corpo no meu se entranharia. Em que o meu olhar no teu mergulharia e a cada toque de pele na pele eu incessante e constantemente por ti me apaixonaria.
Há alturas do dia em que não há dúvidas, apenas uma única certeza: que quero, por completo, ser tua.

12/12/2012