sexta-feira, 14 de maio de 2021

Adeus (à) Vida XXX



Sobrevivo,
Numa existência mediana,
Quase sem sentido,
Nas horas que passam perdidas.
Há um abismo
À minha espera,
Como um oceano imenso,
Em que se mergulha sem medo.
Mas ainda não é hora
De submergir por inteiro,
Ainda há obra para ser feita,
E eu, à escolha não tenho direito.
Partirei quando chegares,
Quando decidires,
Quando a cabeça me empurrares
E eu mergulhando, deixarei os meus sentires.
Por agora apenas aguardo,
Que os dias passem rápido,
Não há força no meu espírito
E o corpo já pouco aguenta.
Mantenho-me à tona,
Com água pelo pescoço,
Quase sufoco com a dor que pesa e me puxa,
Mas ainda assim, luto, flutuo e sobrevivo
À tua espera.


Cat.
2021.02.18


 

Adeus (à) Vida XXIX






Num dia de Verão,
Num dia frio de Inverno
Ou quando as folhas cairão
Do céu, em fim de Outono,
Um dia ela virá,
No seu único terno:
Preto, escuro e sombrio,
E com ela me levará.
Deixarei tudo que amo,
Todos os sorrisos e lágrimas,
Todos os momentos que não viverei.
Será salvação da Alma
Em detrimento da matéria
Ou será apenas o fim
Que nada tem de eterna?
O corpo padece de dores,
A Alma sofre tormentas,
Mas nunca piores
Que tudo que o amor alimenta.
O amor pode ser belo
Ou a maior infelicidade,
Pode ser alegria
Ou uma desilusão sem medida.
Corre o sangue no corpo,
Vermelho carmim,
Pode o amor ser morto
E nunca ter um fim?
Quando ela chegar,
Serei corpo no chão,
Terra infértil, onde flores não nascerão
De tão envenenado o meu coração!


Cat.
2021.02.16


 

Tenho dias em que me sinto assim, perdida neste emaranhado espaço-temporal sem sentido.
Talvez o tenha, mas sinto que perco, a dada altura, o fio à meada. Como um nó sobreposto noutro nó e noutro e noutro noutro...
Hoje sinto-me assim.
Hoje é um desses dias.
Custou levantar, a vontade de sair do quente da cama era quase nula. Na minha cabeça apenas surgia a pergunta: para quê? Para ires para o sofá, ver as horas passarem no ecrã da tv, num filme que não acrescenta nada ao que és? Não te iludas: não irás passar a ferro a roupa amontoada no quarto que não usas; nem tampouco arrumar a loiça da máquina ou tratar da roupa. Vais vegetar, deixando mais um dia passar sem nada fazer.
E assim foi. É verdade. Tudo aconteceu como descrito: horas vazias, cheia de nada, num dia feio de Inverno, cinzento, sem luz. E sem pessoas, sem pássaros, só o cinzento de quase chuva, acompanhada de vento.
Hoje sinto-me assoberbada com tudo na vida.
Hoje já senti medo pelo futuro. Já senti ingratidão. Já senti desânimo e vontade de desistir. Já senti a mente vazia de tudo.
De cada vez que senti estas emoções, tentei contrariar. Tentei mudar o chip e focar na esperança, na fé (seja lá o que for), no aceitar o que vier e em agradecer e acreditar que o dia de amanhã será melhor. Bem melhor.
Eu sei que há retorno para as nossas acções e pensamentos.
Eu acredito que o futuro vai ser melhor.
Eu sei que algo está para chegar e que tudo vai mudar e a vida será bela, cheia de luz.
Eu sei. Eu sinto.
Mas hoje, hoje preciso de mais que um acreditar.
Hoje preciso chorar e os meus receios libertar. Não é isto que quero sentir. Não, definitivamente não é o que quero. Mas é o que sinto e a luta hoje parece impossível de vencer.
Choro. Limpo a Alma enquanto debito o que sinto, nestas palavras que só para mim fazem sentido.
Choro. Peço que as lágrimas salgadas levem esta angústia do peito, esta inércia do corpo e o vazio da mente.
Estou cansada deste momento da vida. Hoje, hoje estou cansada.
Choro e quero adormecer para acordar com outro alento.
Choro pois preciso de força cá dentro.
Eu sei qual é o caminho, está ali, à minha frente, só que perdido nos nós da vida e da mente.
Hoje, estou assim, perdida na vida.



Cat.
2021.02.10

quinta-feira, 13 de maio de 2021

Escrever-te



Eu sei que fiquei de te escrever, de te dizer, de te dar a saber. Eu sei e tu sabes. E sei que relevas a minha falta de palavras.
Não há muito a contar pois os dias correm como sempre: o hoje igual ao e o amanhã idêntico ao hoje.
Horas que passam numa sequência sem significado diverso ao do correr do tempo.
Não há histórias. Não há conversas. Não há visitas ou saídas porque sim.
Há um tempo estranho, que deixa estranha a mim e aos outros. Somos todos estranhos.
Em todos os sentidos.
Não nos reconhecemos, descaracterizados que fomos, parecendo que saímos de uma linha de montagem.
Não nos sentamos como habitualmente ao pequeno almoço ou no café após almoço ou mesmo no nosso posto de trabalho.
Não conversamos sobre o que quer que seja.
Não nos damos e não recebemos.
Não, não, não. Um punhado de nãos que nos impedem de viver.
E ficamos estranhos, eu pelo menos fico, nesta ausência de rotinas substituídas por algo que me deixam mais ausente que presente.
Mais ausente da vida, lá fora na rua e cá dentro de portas e na Alma.
Não há muito a dizer, pois não há muito que se faça.
Mentira: faço o premente esforço de pensar e de me obrigar a acreditar que isto vai mudar.
Mas no fundo, penso que o que vai mudar são as pessoas.
Este afastamento tão real e prolongado está a criar brechas demasiado profundas na personalidade humana.
Deveria tornar-nos melhores, fazer-nos sentir quão preciosa é a liberdade de poder viver, andar, falar e respirar. Mas não... Estamos cada vez mais estranhos, cada vez mais fechados, em nós, nos nossos medos, nos nossos mundos cada vez mais pequenos.
Por isso não te escrevo: não há nada de novo neste novo modo de viver.


Cat.
2021.02.09