segunda-feira, 14 de maio de 2012

Já começou

Gosto quando acordo e o dia já começou, já se sente o reboliço dos catraios a correr atrás de uma qualquer velha e esfarrapada bola de futebol. Quando as mães lhes fazem as últimas recomendações antes de entrarem no portão da escola e os obrigarem a largar o entusiasmo temporário dos 10 minutos de louca correria, imaginando-se os Ronaldos e Messis de amanhã, apenas para lhes entregarem o lanche da manhã. Gosto de ouvir os bons dias de quem passa na rua e reconhece o vizinho que foi à mercearia ao fundo da rua e fala das alfaces que algum outro, lá mais no fundo da rua vende e são as melhores. Passos, ruídos, conversas paralelas de vidas que se preenchem em dias aparentemente desiguais e tão superficialmente iguais.
Mas gosto de vidas que correm, que não estagnam, que fluem mesmo que pareçam paradas.
Gosto de "bons dias"! Da tão intensa fé do desejo que um "bom dia" nos tráz à alma! Gosto do bom dia cantado em sons dobrados do travesso do vizinho na janela do lado! Gosto dos bons dias dos outros que tentam seduzir as fêmeas empolando-se e empoleirando-se em topos de copas de cedros, perfeitamente podados e desenhados, soltando longos cânticos de chilrear que me despertam os sentidos.
Gosto de acordar quando já estás desperto ao meu lado, com o teu doce toque a deslizar-me na pele, o  teu dedilhar no local que sabes, vai despertar antes mesmo de eu acordar.
Gosto de acordar e sentir o corpo desperto nesse automático desejar que me activa e faz viva, sem pensar, sem olhar. Esse calor que me invade ao sabor dos teus dedos em mim, que me obriga a procurar-te sem sequer pensar que não ou que sim.
Apenas corpo acordado, tocado, beijado, dedilhado, tomado, lâmbido, molhado e suado de todo o prazer sentido e deitar de olhos fechados e ouvir no ouvido: acorda, o dia já começou! Bom dia...

2012.05.12

Sede...


A noite cai lá fora. Do outro lado da janela, destas paredes, um turbilhão de vidas corre sob o ameno calor de uma quase noite de Verão. Ouço as vozes de quem sorri aos doces e efémeros amigos de uma qualquer mesa de esplanada. Os copos sucedem-se em sumos que borbulham, mudando as cores que nos alimentam a sede e as vontades.
E eu tenho dessa sede de querer refrescar a boca.
Dessa sede que me faz desejar mais, um vício que não consigo que me largue, uma dependência independente das vontades.
Uma sede inexplicável, sentida a cada dia que passa, a cada hora mais intensa, mas que nunca cessa, pelo contrário! Quanto mais a tento matar, mais ela aumenta. Quanto mais a tento saborear, prolongar o seu sabor em mim, para recordar e me saciar quando não o puder ter em mim, mais me aumenta a vontade!

E deste lado da janela, destas paredes, mato a minha sede de ti, em tragos longos e demorados ou sorvendo-te aos poucos...

2012.05.12

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Nunca o dizer...



Sinto a tua língua deslizar na pele húmida dessa água salgada de suor de dois corpos unidos, enlaçados num só, guardando-me o sabor. Gotas desse esforço inesforçado de nos amarmos, deitados um no outro, sedentos desses líquidos que de nós brotam, como fontes de néctares improváveis, únicos. Sinto o teu olhar demorar-se no meu, falando sem palavras, dizendo sem se ouvir um som, de como me gostas, mesmo perfeitamente imperfeita, de como me sentiras a falta depois de vestidos os dias rotineiros, de farpelas condicionadas a todos os outros olhares. Beijos trocados no murmurar de lábios roçantes, sentimentos demonstrados em abraços demorados, não de despedida, à saída, mas de sou teu e sou tua no tempo que dura o durante. E as mãos entrelaçadas, vão deslaçando o emaranhado de dedos que se apertam gritando em silêncio um adeus quando, na verdade, desejamos nunca o dizer...



2012.05.10

Meu jardim...


Desperta o dia em mim ao ritmo do compasso do tempo dos raios de sol no jasmim. Cheiro que me invade, que aumenta de intensidade, como o calor que no meu corpo, quente dos lençóis carmim em que me amaste, ao lembrar-te vai subindo na pele que se arrepia, que acorda a cada respiração mais ofegante. Jardim luxuriante, húmido de gotas de vontade, misturadas com meu néctar e teu da noite intensa, doce e louca, em que este corpo que agora desperta, foi teu. Peito aberto e desnudo, que cubro e uno com mãos que são apenas as minhas e toco-me onde te desejo sentir e o corpo ondula, querendo mais o teu crescer. O teu entar e sair. O teu me tomar e domar e controlar e mandar. E sou tua, aberta, exposta como o jasmim que, logo pela manhã, se entrega ao sol que invade o meu jardim.

2012.05.11