sábado, 17 de abril de 2021

Palavras chegarão


 

Haverá um dia em que as palavras sairão de forma fluída, sem pressão, sem nelas pensar afincadamente.
Serão palavras de amor, de prazer, de gratidão, de sorrisos e de alegrias.
As palavras, as minhas palavras, são neste momento pensadas antes de escritas.
Não porque não tenho o que dizer ou sentimentos dignos de ficarem registados e, até, partilhados.
Eu tenho palavras e sentimentos. Muitos. Complexos. Dúbios. Difíceis de transcrever para a folha de papel (que hoje em dia é um qualquer gadget).
Tenho saudades da era do papel e da imensidão de possibilidades que o branco de uma simples folha dava. E da leveza e beleza das palavras que de mim saíam.
Palavras de esperança.
Palavras de crer.
Palavras carregadas de amor, de alegria de querer o tanto que havia para viver.
Hoje, ainda tenho esperança.
Hoje, ainda creio, acredito. Em mim, nas pessoas e Mundo.
Mas estão perdidos, num emaranhado sem fio condutor, sem um caminho certo para percorrer.
Sem uma folha branca de papel onde fluir levemente.
Há outras palavras, outras folhas, talvez cinzentas, onde o preto das letras se torna, por vezes, impercetível, incompreensível, impossível de escrever de forma coerente.
Pois há um rodopio, uma montanha russa de sentires que as palavras deixam de fazer sentido.
Talvez, no cinzento da folha, tenha apenas que carregar no preto de certas palavras: as palavras que realmente interessam. E vê-las, lê-las vezes sem conta, sem contextualizar e perceber que significado têm para mim. Separar, como se diz, o trigo do joio e, ficar apenas, com as que me fazem jus.
Sim, haverá um dia em que as palavras voltarão a sair de mim, numa clareza e certeza, como preto no branco.


Cat.
2020.08.28

sexta-feira, 16 de abril de 2021

Palavras presas


 

As palavras ficam presas, agarradas à garganta, num nó que não se desfaz.
Como se não valesse a pena.
Como se não houvessem palavras. As palavras certas.
Um vai-e-vem sem (aparente) sentido. Mas aqui, cá dentro. Prontas a serem libertadas.
De forma confusa.
De forma inexplicável.
De forma pura e simplesmente sentida.
Aqui, cá dentro.
Do garganta que engole em seco, pelo nó que se aperta cada vez mais.
Aqui, cá dentro.
Da mente que não se ordena, que não se concisa e parece louca com pensamentos dispersos e (aparentemente) difusos e contrários.
Sim, há palavras.
Aqui, cá dentro.
Também do peito que se enche de um vazio que parece querer explodir de tanto sentir.
Aqui, cá dentro.
Nos olhos que se enchem de lágrimas, felizes e infelizes. De gratidão e revolta. De querer ser feliz e o medo de o ser.
Sim, há palavras.
Que não saem. Porque aqui, cá dentro do que sou, ainda não as compreendi...

Cat.
2020.08.26

Parada


 

E ela parou.
Ficou ali, sentada, inerte. Olhando.
Olhando o mundo que a rodeava.
Olhando as pessoas no compassado correr dos passos de quem tem onde chegar. Depressa, que o tempo urge.
Para elas, para essas pessoas.
Olhando o ondular do cabelo sob os ombros, tapando-lhe o rosto e fechando-lhe, inadvertidamente, os olhos. Num piscar demorado, lento, quase sem vontade de voltar a abri-los.
E não abriu.
Durante algum tempo ficou assim, sentada, inerte, de olhos fechados a sentir esse vento. E o sol do fim de tarde, quente e suave, como uma carícia no rosto.
E abraçou-se.
Sim, abraçou os joelhos dobrados junto ao peito, ficando fechada em si mesma.
Como uma concha. Como uma carapaça onde só se sente o que ela quer sentir. Onde não há lugar para os outros e as suas opiniões e os seus conselhos e lições de vida.
Ali, parada, sentada, inerte e fechada sobre si mesma, só existe ela.
Aquele ser que apenas deseja sentir paz. Uma Alma que luta contra a sua natureza porque é o melhor para ela.
Uma luta interna. Uma luta surda que às vezes se solta num grito de desespero. Uma luta que não se explica, pois nem ela sabe como.
Apenas um ser em transformação. Numa profunda transformação interior que não se sabe o resultado.
Mas há uma luta ali dentro, do peito e nos olhos que querem soltar as lágrimas presas a uma força quase inexistente.
Mudar não é fácil, mas é muitas vezes necessário.
É como nascer de novo, a cada dia, de um conflito constante entre o racional e o emocional.
Entre aprender que saber dizer que não aos outros é dizer sim a ela. À sua dignidade. À sua estima e ao valor que tem.
Eu sei. Eu sou ela.
Parada, sentada, inerte. Olhando e esperando que um dia esta dualidade em mim existente, se equilibre e eu, em vez de duas, dois extremos, me possa tornar apenas uma.
A que eu verdadeiramente sou.

Cat.
2020.08.03

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Voltar a sentir


 

Quero voltar a sentir.
A ser. A dar. A receber.
O corpo pede e ainda há a sede de (te) beber.
Sinto-te o perfume.
O odor do corpo, ali, deitado ao meu lado.
E há o desejo!
E há a vontade!
Eu quero beijar-te,
Abraçar-te,
Dar-me e receber-te,
Dentro de mim sentir-te.
Entregar-me-te.
Sentir as tuas mãos na minha pele.
Sentir a tua língua descobrir-me novos recantos.
Sentir no teu beijo todo o teu imenso desejo.
Quero em ti perder-me:
Os pensamentos,
Os actos controlados,
Os quereres exacerbados,
Exagerados,
Ilimitados,
Numa entrega sem consequências.
Ser tua,
Entregue ao teu querer,
Submissa à tua vontade.
Ser tua,
De corpo e alma nua,
De forma dura e crua,
De pele, carne, suor e prazer.
Sou tua,
Toma-me o corpo,
Faz-me estremecer,
Faz-me vibrar,
Faz-me sentir que sou,
Sem duvidar,
A tua Mulher.


Cat.
2020.07.30