segunda-feira, 12 de abril de 2021

À tona


 






Submersa. À tona da vida.
No limiar de quase desistir e deixar-me afundar.
Doce, suave, lentamente.
No limiar de querer resistir e unir força e fôlego e emergir.
Rápida, brusca, emergente.
Um limiar que me deixa neste limbo de me sentir perdida. De me sentir sem saber o que decidir.
Descansar.
Repousar.
Dormir e não sonhar ou delirar.
Mergulhada nesta minha estranha forma de ver, de sentir a vida e o que nela acontece. No que por ela passa.
Olhar para o lado e não ver. Não sentir. E sobretudo não analisar. Não tentar compreender.
Há momentos em que penso que deveria pensar menos e ser mais leviana na forma de viver e lidar com os outros e com certas situações.
Não pensar no que me ultrapassa. Porque não me diz respeito ou no que diz.
Na dor das perdas.
No coração dilacerado pelas ausências.
Nas feridas profundas marcadas na alma e no rosto cansado, abatido e enrugado dos sulcos vincados por tantas lágrimas vertidas...
À tona da vida. Submersa no salgado das minhas próprias lágrimas.


Cat.
2020.06.02

Agradecer


 

Por vezes pergunto-me como se agradece a alguém o tanto que nos dão.
Não falo de bens materiais, falo de algo muito diferente, muito mais fácil e no entanto tantas vezes raro.
Há pessoas que moram no nosso coração por variadíssimos motivos. Pela amizade, mesmo quando não estão fisicamente presentes. Pelo facto de sabermos que, em caso de necessidade, podemos recorrer a elas. Porque temos ideais idênticos ou diversos mas conseguimos sempre uma discussão saudável. Pela empatia que, sem se saber como, nos une como almas quase gémeas.
Há pessoas pelas quais sentimos uma gratidão imensa pelo que nos ensinaram, pelo que partilharam connosco, pelos seus sábios conselhos que, mesmo que não os tenhamos seguido, entendemos que era para nos proteger.
Pessoas que, ao longo do nosso caminho, nos educaram e passaram valores que fazem de nós melhores pessoas.
Talvez seja fácil responder: fazendo o mesmo por elas.
Sempre tentei fazê-lo, da melhor forma que sabia, imperfeitamente, mas a dar o melhor de mim.
Falar destas pessoas é fácil por muito que não pareça. Aparentemente só há coisas boas a recordar para agradecer.
Mas há um grupo de pessoas a quem não se consegue agradecer. A quem não basta retribuir da mesma forma. A quem, muitas vezes, nos custa mais do que aos outros.
O Amor que lhes temos é inato, inerente, corre-nos no sangue e enche-nos a Alma. Há, no entanto, uma espécie de amor/ódio que nos une.
Talvez não seja este o termo, não se pode odiar a quem amamos, embora a linha entre ambos os sentimentos seja, quase sempre, muito ténue.
Talvez seja pena ou raiva por darmos o nosso melhor e não nos ouvirem e vice-versa.
Talvez seja porque há toda uma vida em conjunto e as diferenças e divergências se vão acentuando ao longo do tempo.
Há zangas, afastamento, conversas banais ou conversa alguma.
Aquele silêncio que nos mói e dói cá dentro.
Mas há o Amor incondicional.
Mas há a ajuda imprescindível e única que nos podem dar.
Mas a presença sempre que necessária.
E há abraços silenciosos que só o sentido cair das lágrimas quebra. Ali, no meio de duas pessoas tão idênticas e tão diferentes. Que se amam incondicionalmente.
Que sofrem de igual forma com a dor do outro.
Que são capazes de largar tudo por nós, para nos verem realmente bem.
Como se agradece a um pai e a uma irmã que nunca me abandonam?
Que nunca me fecham a porta?
Que me amam incondicionalmente?
Como, como se agradece as palavras certas no nosso momento de desespero?
Jamais terei como te agradecer Pai.
Jamais terei como te agradecer minha irmã.
E eu amo-vos eterna e profundamente.
E jamais saberei como vos agradecer.

Cat.
2020.05.22

sábado, 10 de abril de 2021

Condimento


 

Amar(te)
É condimento
Na minha vida.
É alimento
Que obriga à minha vinda,
Uma, outra e outra vez.

Amar(te)
São gotas de orvalho
Numa pétala de flor,
Como lágrimas nos olhos
De te querer com tanto ardor.

Amar(te)
É sal do mar
Na pele seca do sol,
Como depois de me te dar,
Numa entrega cheia de fulgor.


Cat.
2020.05.20

Capazes de tudo



Achamos que somos capazes de tudo. Ou melhor, de ultrapassar tudo. Todas as dores, todas as perdas, todas as desilusões.

Mas não. Não conseguimos.

Ficam marcadas em nós, para sempre, mesmo que num cantinho escondido da nossa memória. São como as pequenas rugas no rosto, que se vão instalando, ao longo do tempo, subtilmente.

Quando damos por nós, há uma infinidade delas, gravadas na pele e no coração.

Achamos que somos capazes de ultrapassar tudo.

Mas na memória, no coração, essas rugas vão mais fundo, tornando-se sulcos por onde se sangra, cada vez mais fundos, cada vez mais transbordantes e o coração, a alma, a mente não aguenta mais. E chora. Lágrimas caiem no rosto pelas rugas do tempo, cada vez mais fundas também.

Achamos que ultrapassamos tudo.

Mas guardamos cá dentro. E a verdade é que, na maioria das vezes, não há quem compreenda essas lágrimas, pois são tão profundas e por vezes tão antigas que nem nós as explicámos por falta das palavras certas.

Eu tenho a sorte de ter ao meu lado quem, mesmo não as percebendo porque as debito sem sentido lógico, me ouve. Porque os sentimentos não são lógicos, são um aglomerado, muitas vezes um emaranhado e intrincado novelo com pontas e fios cruzados, sem nexo.

Mas mesmo assim, sem nexo, tem a coragem de ficar ao meu lado, de me tentar compreender, de me ajudar a perceber. De me dar a mão e me guiar no meio desta confusão que é o meu sentir.

E é nestes momentos, em que mais preciso de quem me dê a mão, que a tua presença é constante e o teu abraço mais forte e o teu amor mais se demonstra e me suporta.

Eu tenho a sorte de te ter comigo, de sentir que, contigo a meu lado, as minhas feridas, se vão fechando.

És tu que me dás alento.

És tu que eu quero ao meu lado. Até ao fim dos meus dias, fortalecendo os nossos laços com a coragem desse teu amor.

Porque em mim também há amor. Um amor que também não tem palavras suficientemente eloquentes para definir o que é amar-te.




Cat.
2020.05.22