terça-feira, 15 de maio de 2018

Já fui



Sabes,
Já fui uma mulher desprezada. Das que ficam em casa, sós, abandonadas ao seu próprio desprezo. E sim, desprezei-me por me deixar arrastar num tempo (quase) infindável de dias sem apego, num existir de apenas (sobre)vivência forçada.

Sabes,
Já fui uma mulher desprezível. Das que se condenam à boca cheia pela vergonha alheia. Não é suposto viver uma vida dupla, mesmo que não se chegue a concretizar o acto. Não é suposto chegarmos a apaixonarmo-nos enquanto não se resolve o que está para trás. Não é suposto que algo se sobreponha à opção do compromisso, mesmo que se esteja sozinha, abandonada ou desprezada. Não há desculpa para tal escape, para conversas que nos façam olhar para nós como alguém desejável, excitante e interessante. Depois do compromisso assumido a vida morre ali: aos olhos dos outros, se isso não acontecer, seremos sempre desprezíveis. Num primeiro impacto, num primeiro olhar, numa primeira perspectiva seremos sempre traidoras, culpadas, putas e, portanto, desprezíveis.

Sabes,
Agora não me importa o que pensam, se me condenam ou elevam.
Agora importa-me olhar no espelho e saber que sou fiel a quem realmente interessa: a mim. Ao que sou, ao que quero, ao que amo e ao que me desespera, ao que não desejo e ao que me faz vibrar. E não tenho vergonha do que sou, do que fiz, do que senti ou desejei, do que disse ou nunca verbalizei.

Sabes,
Agora gosto-me mais do que alguma vez me gostei. Com todas as minhas perfeitas imperfeições.
 
 
2017.08.12

Se os meus olhos falassem

Se os meus olhos falassem o que diriam?

Que as salgadas lágrimas que deles brotam são de dores ou alegrias?

De todos os momentos em que o sol, apesar de brilhar, não me aquecia o coração, não me chegava à alma.

De cada vez em que recordo a minha mãe e sei que o seu abraço era único e que sou privilegiada por ainda não ter esquecido o seu cheiro, o calor do seu corpo.

Naquele instante em que te olho, meu amor, e não resisto à felicidade que é tu me amares e como perfeita me veres e sentires.

Se os meus olhos falassem diriam que a cada dia há um sentir diverso, um ver diferente.

Há um sonho que morre e uma esperança que nasce.

Há lágrimas que quase me matam e outras que me renovam.

Se os meus olhos falassem diriam que eu simplesmente vivo!


2017.08.07

Tão simplesmente

 
Há dias em que me sinto pequena.
Uma mulher pequena, com uma alma pequena, a viver uma vida pequena.
 
Pequena na verdadeira essência da palavra.
Pequena de sentimentos, de vontades, de acções.
 
Em que sinto que não passo de alguém que sabe apenas sobreviver. Um dia de cada vez.
Em que a felicidade é efectivamente efémera e o dia a dia é cheio de pequenas e vazias situações que acabam por encher(me) de penas e dores.
Em que tudo me esgota.
Em que as forças de olhar o dia como algo novo não passa de uma mera ilusão.
 
E eu canso-me. Demasiadamente depressa.
E deixo de sonhar, de querer alcançar e invade-me esta sensação de (quase) desistir.
 
Não há sol que brilhe o suficiente.
Não há flor em que o perfume me inebrie o suficiente.
Nada é suficiente. Nada chega para inundar o vazio que se apodera do corpo, da alma e da mente.
 
Um passar de horas igual ao de ontem.
 
Isto tão somente.
 
Um mundo pequeno, de dias imensamente longos.
Uma vida pequena, sem grandes feitos, com a sensação de não deixar, legar, ensinar nada.
 
Isto tão simplesmente.
 
 
2017.08.06

Mundo

A noite já domina há muito as cores do céu e o sol já se perdeu, faz horas, por trás da linha do horizonte.

O silêncio domina a rua, agora vazia de gente, sem o cantar dos pássaros e o riso das crianças.

Aqui dentro não há silêncio que resista.

Aqui dentro do meu peito há um ardor que me queima.

Um aperto que me esmaga. A Alma.

Nos dias que correm, onde a informação voa de forma inimaginável penso: como é possível?

Como é possível que em pleno século XXI ainda há tanta fome, tanta xenofobia, tanto desprezo para com o Ser Humano, para com os animais?

É desolador ver as notícias.

É desolador saber o que se passa pelo Mundo.

É desolador de uma forma que me sufoca o respirar. De uma forma que não contenho as lágrimas. De uma forma que me sinto de tal forma impotente que me dói cá dentro, que me dilacera como uma faca.

E depois, olho para o "meu mundo" e vejo como sou uma mulher de sorte. Como as pessoas que me rodeiam são boas, simples e com um coração enorme.

Vejo que tenho tudo, que ainda posso olhar o Mundo e, no meio de tanta feiura, sentir que ainda há esperança. Que o céu azul ainda me faz sonhar, que o mar será eternamente salgado e igual às nossas lágrimas. Que ainda podemos mudar algo e que a maldade, o egoísmo e a falsidade serão, um dia, apenas uma lembrança de um sonho menos bom.



2017.07.25