quarta-feira, 31 de março de 2021

Verdadeiramente viver


 

É nos intervalos da vida
Que a minha mente
De pensamentos
É invadida.
É nesses momentos
Em que a noite é igual ao dia
Que penso nos intensos
Teres e sentires que havia.
Nestes intervalos,
Em que os minutos passam
Devagar pelas horas,
Em que o ar que respiro,
Rarefeito, me lembra do que eras.
Viver intensamente,
Amar profundamente,
Dar-se sem freios,
E que pensámos serem para sempre,
É ilusão,
Pois tudo tem um senão:
A eternidade é apenas um momento.
E entre o viver da felicidade,
Há os intervalos da vida,
Em que viver é uma dor profunda
Em que o tempo passa,
Mas não impune.
É assim, nestes lapsos de dias,
Que mais tempo passamos
A remoer para depois renascer,
Em vez de verdadeiramente viver...


Cat.
2021.01.31

terça-feira, 30 de março de 2021

Vida em suspenso


 

Hoje parei e olhei(me) no espelho.
O rosto pálido, com marcas de cansaço, que o dia foi longo e difícil.
Mas olhei(me) para além do óbvio. Olhei(me) e vi as marcas de todos os dias que já vivi. Inclusive das horas em que apenas deixei que passassem por mim.
Sim, houve uma altura da minha vida em que os dias apenas passaram. Sem nada de relevante, sem qualquer marca que pudesse fazer deles algo diferente, que se destacasse. Não fui feliz nem infeliz. Apenas (sobre)vivi.
Não criei, não cresci, não mudei. Apenas (sobre)vivi.
Um estado de dormência contínuo apesar de acordada.
Uma inércia perante um passar de dias sempre iguais, sem mudanças.
Mas ninguém vive assim durante muito tempo e a dada altura, há a premente necessidade de olhar para (dentro) de nós. Um vazio. Um vácuo que quase se toca. Uma série de anos sem nada a destacar.
E, sem dúvida, a ruptura a chegar.
A ruptura da Alma, da nossa essência, do que perdemos, do que não vivemos.
Não somos uma parede que, apesar de de algumas rachadelas, se mantém firme, sem mostrar o passar do tempo. Nós somos folhas de papel, onde todos com que lidamos nos marcam com palavras. Folhas de papel em que o passar do tempo vai amarelecendo o branco. Como folhas de papel marcadas, pelo bom e pelo menos bom, na pele, no coração e na alma. Folhas de papel onde as nossas histórias, as nossas vivências, as nossas lágrimas e os nossos sorrisos podem ser lidos, tocados. Como um livro que se descobre.
No meu rosto já há marcas de choro, de riso, de sofrimento e de alegria.
Mas, felizmente, há espaço para muitas mais.
Para mais vida.
Para mais crescimento.
Para mais momentos que valham a pena.
Para mais pessoas a ensinar-me.
Para mais, muito mais. Porque ainda é cedo para parar e eu já estive de vida suspensa demasiado tempo.

Cat.
2020.01.06

Ele(s) X

 


Ela:
É no quente do leito que mais sinto a tua falta: há um frio quando deito a cabeça na tua almofada.
Fica apenas o teu cheiro.
Não posso mais que não seja desejar este momento eternizar, num recanto da memória e aí, para sempre o guardar ou acrescentar uma nova história.
Gosto de pensar que és meu, mesmo quando aqui não estás. Que me pensas no meio do dia e que anseias por uma nova vinda.
Sei que tens um mundo lá fora, para além desta cama e que nunca imaginei que me abalasse tanto cá dentro.
Era uma brincadeira, uma picardia e o desejo do corpo que, a cada mensagem recebida, a cada atrevida fotografia, tremia.
O desejo do pecado, do proibido, que dizem e concordo, é o mais desejado.
Esqueceram foi de avisar que a intimidade é que importa: além do corpo e do toque, a mente em sintonia.
E agora aqui deitada, mesmo no quente, sinto a cama fria...

Ele:
Acabo de fechar a porta onde ficas deitada, na cama onde acabei de te sentir toda minha.
Tenho vontade de voltar para trás e de ao teu lado, me deitar, deixar ficar e adormecer.
O êxtase em que me deixas por em ti poder entrar, leva-me as forças e deixo de pensar: só por ti anseio, por te poder tocar, sentir, penetrar e o teu sabor sentir no paladar.
És um pecado em todos os sentidos.
És o desejo tornado realidade e não imaginas o quanto te anseio.
Mas o que me retém à porta e impede de ir embora, é a minha vontade de te ter sempre minha. O teu sorriso não me abandona, o teu humor é a representação do que mais me encanta.
Mas o que me detém à porta e impede de entrar, de regressar, é a tua independência, o teu de mim não precisar.
O que te passa pela cabeça quando viro costas? Pensas em mim como eu em ti? Querer-me-às pertencer como eu pertenço a ti?
Apanhaste-me mulher, no meio do jogo em que me sentia rei, acabei por perder e se não me voltares a querer, a minha vida perde sentido, eu sei.
Mas sigo caminho e deixo-te no leito, não onde apenas te possui, mas onde o corpo e a alma amei.


Cat.
2021.01.30

segunda-feira, 29 de março de 2021

Talvez seja


 

Lá fora acontece aquele momento do dia em que o crepúsculo inicia mas a noite ainda rege o (meu) mundo. Ainda há luzes a bailar por entre os ramos das árvores despidas de folhas. Ainda não há sons de pessoas a passar na calçada, nem o som das conversas entre vizinhos no passeio da rua. Os sons são dos poucos pássaros aventureiros e destemidos que enfrentam as madrugadas de Inverno.

Aqui, dentro do meu quarto, não é diferente. Há uma vida latente, à espera que o tempo passe e se acorde para a vida se repetir na sua (im)previsível rotina.

Excepto eu.

Eu já acordei. Eu já respiro o amanhecer. Eu já despertei da tão abençoada letargia do dormir, do fechar os olhos e do não pensar. Do não ver. Do não sentir.

Às vezes penso que não sentir é uma bênção. Ser indiferente ao que me rodeia. Poder encolher os ombros como um simples "é a vida" e continuar a viver os dias de forma inabalável.

Mas não, cá dentro de mim, há coisas que não me são indiferentes. Há coisas que, apesar de não serem comigo, me abalam da mesma forma. Há coisas que vejo, por vezes até "banais" que me fazem pensar numa escala diferente, como que a pensar do que as pessoas são capazes de fazer. Há coisas que para mim são impensáveis e fico chocada, verdadeiramente chocada. E neste momento, neste preciso momento do choque, é que me apercebo que o Ser Humano é um animal que tem muito, mas mesmo muito, para aprender, para crescer, para, no fundo, se aperfeiçoar.

Talvez devesse fechar as olhos e o coração, fazer de conta que não vi e quem não vê é como quem não sabe...

Talvez seja empática em demasia.
Talvez seja expectativa em relação às pessoas em demasia.
Talvez eu me reja por um código demasiado exigente.
Talvez a minha consciência seja demasiado intransigente...
Não sei. Acho que nunca saberei. Sei apenas que me dói, a Alma e o coração, com tanta falta de amor.
Amor por nós, pelo próximo e pelos outros seres vivos.

Às vezes gostava de me manter, na exacta redundância, da dormência de (um qualquer) dormir.

Cat.
2020.01.04