terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Ele(s) III


ELA:
Podia ser diferente e não se contentar em apenas se entregar de corpo e alma. Raio de mania essa de se dar por inteiro. De querer ser tudo o que ele deseja: a amiga, confidente, mulher, mãe, amante... Mas não é possível e aos poucos, a cada falha, a cada nova tarefa incumprida como deseja, apercebe-se da sua impotência em consegui-lo ser.
E isso mata-a. A pouco e pouco, aos bocados e demoradamente. E martiriza-se pensando na sua enorme incapacidade em ser perfeita. E frustra-se a cada pensamento. E os olhos não brilham, os lábios não sorriem e o corpo não deseja. E ele, na cabeça dela, vai deixando de a amar. A pouco e pouco, aos bocados e demoradamente.


ELE:
Podia ser diferente mas gosta dela assim, tal como é. Com as suas pequenas imperfeições: faz dela uma mulher real, que a ele se equipara. Sim, ele não é perfeito mas também não tenta ser. Sabe que podia ser melhor mas é feliz assim porque ela o aceita. Como ele a ela. E não importa que não seja a melhor cozinheira, a perfeição a passar a ferro ou que não aspire a cada poeira no chão da sala.
Ele ama-a pelo sorriso, pelo olhar sedutor e apaixonado, pelas curvas de um corpo que se sabe mover e o excita. Pelos beijos. Pelo sexo. Pela companhia. Pelo sexo que é (quase sempre) fenomenal. Sim, o sexo é importante para ele. E ela preenche todos os seus requisitos.
Sente que a rotina das tarefas diárias são um peso demasiado grande na forma como ela reage e quer mostrar-lhe que nada, mas mesmo nada é mais importante que estarem juntos. Verdadeiramente juntos, abraçados, enroscados ou apenas, um ao lado do outro, sentados. E mesmo que a ausência de palavras impere, não é constrangedor ou mau ou sinal que algo não está bem ou que ele esteja saturado dela ou mais um milhão de outras coisas que passam pela cabeça dela! Não, é apenas porque não há necessidade de encher o silêncio. É porque é confortável. E não há nada melhor que saber apreciar momentos a dois, em silêncio.

17.02.2016

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Ele(s) II



ELES:

A cada dia se importa menos com o tanto com que se importa. Vai-se esvaziando das preocupações.
O que ele não sabe é que a diminuição do importar é equivalente ao aumento da indiferença, à diminuição do amor.
Do amor não, que ela continua a amar com a mesma intensidade, ou talvez mais. É mais consciente o sentimento. Como o é a importância que dá às coisas.
Ela sabe que não basta amar.
Ele pensa que só isso importa. Que tudo o resto é secundário, de menor dimensão no que significa amar.
Ela cansa-se das rotinas massacrantes de a cada dia tentar que o amor prevaleça.
Exausta deixa de se interessar pelo que ele faz pois ele sente que é pressão.
Deixa de dizer que o ama pois dizia-o vezes demais e, para ele, perde a verdadeira essência do sentimento.
Deixa de o seduzir com mensagens onde demonstra o quanto o deseja, de uma forma tão explícita que ele lhe pede para parar pois está a trabalhar.
Deixa de o procurar com a intensidade e a vontade de quem quase morre de fome ou sede porque os corpos, mais imperfeitos por culpa do passar do tempo e do aumento do típico desleixo, já não respondem da mesma forma e para ele é ponto fulcral que ambos estejam bem. Mesmo que ele não esteja. Mesmo que ele falhe mais que ela. Mesmo que ela sempre tenha estado bem com o corpo que tem.
Desistir de se importar é o que ela acabará por fazer.
Não por já não o amar, apenas por sentir que não vale a pena lutar. Porque um dia, pouco se importará com o que ele possa fazer... E aí será tarde, já não haverá volta a dar.
E o amor acabará por ceder à rotina do não se importar, à sensação que, por ele, já não vale a pena lutar.



13.Fev.2016

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Escrever(te)



Pergunto-me porque escrevo e a resposta não surge fácil na ponta dos dedos. Nem na ponta da língua ou em pensamentos coordenados. Não! Aparece de forma disforme, confusa e desordenada.
Vários pensamentos vão-se formando na mente. Pensamentos não, são mais palavras que se unem a outras palavras e formam uma frase. E tenho que a escrever.
E o restante é uma catadupa de palavras chave que se vão encadeando umas nas outras. E nas quais não penso. É uma espécie de acto reflexo que muitas vezes, quando as palavras realmente se marcam presença na mente, tudo parece confuso, chegando a parecer ilógico.
Não sei porque escrevo.
Nem tão pouco sei se escrevo.
Debito palavras que fazem mais ou menos sentido.
Não é para outros. Não tenho a pretensão de ser lida e, muito menos, compreendida.
Não é para mim. Conscientemente não o é. Nunca releio as frases que se vão formando e firmando em linhas de coerência dúbia.
E há a sensação de repetição. De monotonia demasiado enfadonha e descolorida de novos sons e compassos.
Tudo sempre igual, semelhante ao anterior. A culpa? Das palavras! Dessas palavras que ecoam de forma permanente na minha mente. Palavras que me são fiéis e não me abandonam jamais. Palavras sempre presentes e constantes.
Houve tempos em que escrevia para ti. Em que te respondia ou te dizia o que de mais profundo sentia, desejava, ansiava.
Houve alturas, muitas e durante muito tempo em que todas as frases te faziam sentido.
Agora, nada o faz. Agora que já não me lês, todo o sentido se torna (im)possível.


11.Fev.2016

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Ele(s) I


Se o ama? Sim, ama.
Com toda a força que há dentro dela.
Com todos os poros da pele dela.
Com toda a alma e entrega e companheirismo e amizade e carinho.
Sim, ama-o.
Como jamais amou antes. E não, não sente a velha máxima que prega aos sete ventos como verdade empírica: " o nosso maior amor é o último".
Não.
Este é o amor que a fez crescer, amadurecer como pessoa, mulher, companheira e amante. Dele e acima de tudo, dela. E do seu corpo que não sabia desconhecer tanto até ao toque dos dedos dele a terem ensinado, até ter encontrado o desnorte de se entregar aos prazeres da pele, da carne e do sexo.
Sim, porque o sexo não é tabu. Nem proibido. Nem pecado. Pecado é passar a vida sem saber que há muito além do sexo no sexo.
Há partilha, confiança, diálogo e os limites não têm preconceito como sobrenome, apenas respeito. Por ela, por ele e por ambos.
E dele sorveu, como alguém esfomeado pela vida, tudo o este lhe poderia dar.
E aprendeu que a vida deve ser regida assim, como o sexo: sem culpas, de consciência tranquila, respeitando os limites dos outros e os seus.
Que tudo deve ser vivido com prazer, alegria e vontade genuína. Genuína, aprendeu a gostar do que é, sem vergonha das opções que eventualmente faz, sem receio de falhar, sem se agarrar ao que é seguro.
Com ele aprendeu a voar... Como não amar quem nos ensina a voar?



11.Fev.2016