quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Libertar


E o céu chora do outro lado da janela, sob o ritmo compassado das horas feitas madrugada de um dia que tarda em chegar.
Pingos de água que lavam as folhas amarelo dourado de carvalhos e plátanos que carregam o suave pó de um Verão que não deixou marcas visíveis ao olhar dos outros.
Gotas que núvens negras libertam aliviando a dor de um céu que é constante e perfeito nas suas cores e tempos.
Chegou a hora de, tal como nesse azul imenso, me libertar das dores de um nunca ter, de um jamais sentir, de uma incapaz partilha e por mim, pelo meu querer respirar sem me sufocar, vou de ti me largar.
Vou misturar-me as lágrimas de sal com as que caiem de cima de mim num corpo que se entrega e rende ao ritmo desse cair.
Vou abrir-me a alma e deixar entrar esse rio que vem para me lavar.
Vou de ti me purgar, desintoxicar e este sentir fazer terminar.
E esperar que ao mesmo tempo que o céu deixe de chorar, eu o possa olhar e por fim, a viver recomeçar.

Sempre vivo

E o adeus regressou,
Num desaparecer sem palavras,
Sem um até já
Mesmo que nunca aconteça.
Cortaste-me de ti.
Rompeste-me o nós.
Arrancaste-me do teu peito.
De forma definitiva,
Sem regresso possível,
Sem me sentires a ausência
Ou companhia,
Sem vontade de voltar,
Com toda essa tua certeza.
E o adeus regressou
Sob forma de um até nunca,
Sem pronunciar palavras
Que nunca ditas são desejadas,
Para poder avancar,
Que ditas são odiadas.
E é este teu afastar
Que me vai fazer crescer,
Que me vai fazer olhar
Os dias com outro parecer,
Mesmo que a dor em
Mim impere,
Mesmo que o amargo sabor do abandono
Me controle,
Jamais te esquecerei,
De ti me separarei,
E assim,
Serás sempre vivo
Em mim.

27/09/2012

Meu vício

Há dias em que me apetece deixar que o Sol se esconda por trás do mar azul laranja e que ali fique mergulhado iluminando outros locais que não os que o meu olhar alcança. Prendê-lo nessa cor e nesse estado, como no tempo parado, perpetuado em sons de ondas de mar constantes desfazendo-se em lágrimas de sal que se confundem e misturam com as que dos meus olhos caiem.
E não deixar que caiam mais.
Não quero sentir que te perdi, que te largaste da minha vida sem retorno.
Quero que o tempo páre e te suspenda neste sentimento que não é perda nem ida, que não é ficar nem ganhar e que nunca avance para a certeza de não te ter.
Mas não tenho forma de o segurar. Nem nas memórias cada vez mais vivas que ficam em mim.
Sabes que jamais te largarei. Que jamais sairás de mim.
Não há forma de te esquecer, de contigo não sonhar.
És um vício do qual não consigo deixar de depender...
26/09/2012

Memória viva

A manhã traz no suave e doce Sol de Outono o toque que me aviva a memória do teu odor ainda gravado na pele que foi amada.

Não importa se agora, se ontem ou há tantos dias que já não se contam porque se esbatem na vida igual de tempos que correm sem mudanças.
Não importa se agora, há memórias que não nos deixam. Que ficam em nós de forma intemporal e eterna.
Como o teu sabor num beijo que mesmo terminado me acompanha como que sentido há apenas instantes.
Como o toque da tua mão sobre a minha deslizando e percorrendo-me de forma que me inspira e desperta para o dia, para a vida.
Como o salgado do teu corpo que com o meu me envolve num entrançado que marca levemente a carne numa intensidade impossível de descrever.
Sim, és tu que vives em mim. Num sentir que feito memória me alimenta e me acorda a cada manhã com a sensação de que nunca daqui saiste, de que nunca partiste.


26/09/2012