sexta-feira, 16 de março de 2012

Inacabado


Há sentimentos que não se explicam.
Tomam conta de nós como se de uma erva daninha se tratassem: não sabemos como aparecem, ganham raízes profundíssimas e nunca desaparecem. Por mais que tentemos estão lá sempre. E mesmo que pensemos que acabaram, que desapareceram de vez, desenganem-se pois reaparecem com mais força ainda, enterrando-se e embrnhando-se ainda mais.
Há sentimentos assim, que se prendem nas nossas entranhas, que se escondem no âmago do nosso ser e ali ficam, adormecidos, à espreita da melhor oportunidade para aparecerem. Para nos voltarem a atormentar! Sim apenas para isso.
Sentimentos que gostaríamos de nunca experimentar. Que nos fazem sofrer vezes sem conta sempre que decidem voltar.
E trazer com eles esses desejos impensados de mar e de beijos nunca dados, mas sentidos e quase provados.
Tu és assim, apareces e desapareces de forma inconstante e repetida e sempre que te perco arranco-te da minha vida.
Qual erva daninha que não se quer, não se deseja.
E de vez em vez, regressas e fazes-me acreditar de novo que tudo é possível, que o sonho é realizável. Com essa força que só tu tens, que só tu consegues fazer vibrar em mim.
Sim, és como uma erva daninha, nunca desapareces.
És um constante, premente e presente sentimento inacabado...

15/03/2012

Lágrimas



Doces lágrimas de sal que caiem dos olhos são meras lembranças de manhãs de orvalhos.
Escorrem, abrem caminhos na pele do rosto, vivem sem margens, morrem na boca.
Boca que tantas vezes se inundou com beijos de água com sabor teu.
Sabor que não esquecerei, sabor em que me viciei.
Vício que se entranha na pele, que me corre no quente fervilhar do líquido que me faz viver, que me faz pulsar.
E como pulsou ao ver o teu olhar. E como pulsa apenas de te pensar.
E revivo os momentos nossos, preciosos no amar, no beijar e no partilhar.
E o sorriso volta a brilhar por até voltar a imaginar aqui, ao meu lado, respirando e vivendo do mesmo sonho que eu sonhei.
Os  dias que junto a ti passaria, os minutos que ao teu lado correriam rápidos, velozes, sem medo do futuro.
Futuro que adormeceu. Que quebrou. Que não aconteceu.
E o sonho morreu.
E eu volto a chorar. A chorar doces lágrimas de sal por tu já não seres real...

15/03/2012

quinta-feira, 15 de março de 2012

Silêncio VI


Os silêncios que me inundam hoje são os teus silêncios. Poderiam ser os meus, mas não, são os teus.
São as tuas dúvidas que me invadem o pensamento de forma arrepiante e profunda.
Penso os teus silêncios na minha mente. Sinto os teus silêncios no meu corpo.
Não é a tua ausência. Estás cá, presente, sempre em mim, comigo, ao meu lado portanto, não é de todo a falta de ti qe sinto. É o teu silêncio.
O silêncio de quando me observas os movimentos e me queres perceber, sem perguntar.
O silêncio de quando me lês as palavras e tentas perceber significados ocultos em frases quase sempre sem qualquer outro sentido, sem perguntar.
O silêncio de quando te martirizas imaginando-me em fantasias deitada numa cama que não partilhas, acompanhada de outro que não tu, sem perguntar.
Silêncio é o que te devolvo, pois sem perguntas não há o que dizer.
Pois sem palavras escritas, não existem cartas respondidas.
Pois sem folhas ao vento, não há Outono. Sem flores de cheiro não há Primavera.
Como sem o teu sal, o meu mar não é igual.
Mas no meu silêncio, neste que não te invade porque de mim te abandonaste, há toda a minha vida, existem todos os meus passos, todos os meus sentimentos, todos os que te são dedicados.
Os silêncios que me invadem são os teus.
São os silêncios de quem opta por não me falar e ainda assim, no silêncio que é teu, que me constrange, me parecer cobrar. Cobrar de mim. Do que me queres. Do que me desejas.
Do silêncido do que me amas e tantas, mas tantas vezes me odeias.

15/03/2012

Todos os cheiros


Os dias são ricos em acontecimentos, nada mais simples e básico.
Há passagens durante o dia que são banais aos nossos olhos e quase, quase passam despercebidas.
E há momentos que nos marcam de forma profunda e, inegavelmente ficam em nós gravados, cravados na memória, como uma lapa na rocha, daquelas que teimam em não sair, em não largar de nós. Imagens que nos saltam à lembrança dos olhos e dos sentidos e nos fazem reviver de novo esses momentos.
Como certos cheiros. Eu tenho gravados na memória cheiros. A minha memória é carregada de cheiros.
O cheiro dos meus primeiros anos de vida, em que as caixas de botões de todos os feitios, se abriam e traziam com elas o cheiro mágico de horas passadas em mundos divididos em degradees de cores e tamanhos.
O cheiro dos cadernos e livros escolares quando chegavam a casa, ainda sem a marca lateral na capa de nunca terem sido abertos, lidos, escritos. Ou do lápis com a ponta perfeitamente afiada e que teimava em não deixar a minha mão desenhar as letras como deveriam ser desenhadas.
Sim, estes cheiros estão gravados em mim e tão vivos como outros cheiros mais recentes.
Há cheiros que me relembram momentos e fases da vida: o cheiro de um sabonete que tem no nome os campos do nosso país; o cheiro do eucalipto que, por momentos, limpava minha alma; o cheiro dos cabelos aquando o abraço da mãe e, sem dúvida, o cheiro da madeira e das colas que, quando trabalhadas pelas mãos do meu pai e aos meus olhos, criavam verdadeiras obras de arte.
O cheiro da Primavera com perfumes de flores, de canteiros de tulipas e frésias brancas e amarelas, de prímulas no jardim ao lado do poçoo de água, que não derramava uma única gota, de violetas, singelas e pequenas...
E o cheiro das pessoas.
Sim, dessas que abraço na minha vida que, por qualquer razão, se cruzam por mim, comigo e em mim.
E as que se cruzam em mim são as que deixam os cheiros mais intensos. São cheiros únicos, inimitáveis, inigualáveis, insubstituíveis.
São cheiros completos... Os cheiros dos sorrisos nos lábios, o cheiro do poder de uma companhia, do abraço de uma amizade, do beijo intenso de um amor ou da lágrima a cair por desamor. São parte de mim, são o que fizeram de mim o que sou hoje.
E guardo-os a todos, assim como a um tesouro, com o maior dos cuidados, naquele lugar especial da memória: a alma. Na minha alma guardo todos os cheiros...

15/03/2012