Tento escrever qualquer coisa, o que quer que seja e nada.
Não há palavras.
Não há memórias.
Não há sentires.
Nada.
Há uma mesa de café, pessoas reunidas a falar de uma qualquer banalidade do dia.
Ao fundo joga-se bilhar e há um casal que fala baixinho no meio de tanto ruído. Ela sorri enquanto ouve o que ele diz. Não são novos, não estão apaixonados, mas têm entre si aquela cumplicidade de quem se conhece, de quem ainda ouve com interesse o outro.
Lá fora chove. Numa cadência sem ritmo, cria uma melodia que me deixa ausente deste local.
As gotas na janela, escorrendo pelo vidro, fazem desenhos que parecem caminhos. Ora unindo-se a outras, ora afastando-se de novo. E neste (des)cruzar encontro um paralelismo, para mim evidente, com a vida.
Como se o caminho fosse apenas um. Num único sentido, sem possibilidade de voltar atrás. Por vezes rico, transbordante, carregado de vida e rápido. Ou solitário e parecendo parado no tempo. Unindo-se e separando-se de outras gotas, aumentando e diminuindo o frenesim de o percorrer.
A vida é uma janela carregada de gotas de chuva. E eu sou uma dessas gotas, às vezes parada, às vezes correndo. Às vezes num rumo cheio de curvas, isolada. Outras acompanhada e percorrendo o mesmo caminho.
Gota numa janela. Criando o seu percurso, deixando a sua marca, crescendo, perdendo e ganhando outras gotas pelo caminho.
Gota numa janela. Tão visível e, no entanto, tão transparente e insignificante...
Cat.
2020.01.17